A defesa de Gilberto Rodrigues dos Anjos, acusado de matar e estuprar mãe e três filhas com idades entre 10 e 19 anos, em novembro de 2023, em Sorriso (MT), está tentando mudar o local do julgamento. Nesta quinta-feira (17/07), o Ministério Público de Mato Grosso deu parecer negativo para o pedido.
O pedido buscava transferir o julgamento do Tribunal do Júri da Comarca de Sorriso para a Comarca de Cuiabá. A defesa alegou possível parcialidade dos jurados e risco à integridade física de Gilberto, caso o julgamento ocorra na cidade onde os crimes foram cometidos.
No entendimento do promotor de Justiça João Augusto Veras Gadelha, da Procuradoria Criminal Especializada do MP, não há qualquer elemento concreto que indique que os jurados da comarca não estejam aptos a julgar o caso ou que o acusado esteja em risco.
“Não se desconhece que o caso em tela alcançou significativa repercussão, inclusive em âmbito nacional. No entanto, é entendimento consolidado dos tribunais superiores que a mera notoriedade dos fatos, por si só, não é suficiente para justificar o desaforamento”, pontuou.
O promotor também considerou irrelevante, para fins da mudança, o fato de o réu estar atualmente custodiado na Penitenciária Central do Estado (PCE), em Cuiabá. Segundo ele, isso não configura risco iminente relacionado ao julgamento. Além disso, o próprio juízo da comarca de Sorriso não se manifestou contra a realização do júri na cidade.
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Gilberto Rodrigues dos Anjos, de 32 anos — Foto: Divulgação
Indenização
Em junho, o viúvo e a avó das meninas entraram com um pedido de indenização contra o Estado de Mato Grosso, no valor de R$ 40 milhões, por negligência e omissão durante as investigações do crime. No processo, o advogado Conrado aponta que o autor da chacina tinha um mandado de prisão em aberto, por latrocínio, desde outubro de 2022, mas estava solto.
O processo é movido por duas ações, sendo uma no valor de R$ 20 milhões, por parte do viúvo, Regivaldo Batista Cardoso, de 46 anos, e outra, também no valor de R$ 20 milhões, por parte da mãe da vítima, Soeli Fava Calci de 75 anos.
De acordo com o advogado, ambos os processos aguardam o agendamento das audiências para depoimento de testemunhas e carimbo e assinatura do servidor responsável pelo documento.
“O processo da Soeli está um pouco mais adiantado por conta da prioridade de tramitação, pois ela tem 76 anos de idade. Mas nenhum ato importante foi realizado”, explica.
Crime
O crime ocorreu entre a noite de 24 de novembro e a madrugada de 25, mas só foi descoberto pela polícia no dia 27, quando os corpos da mãe e três filhas foram encontrados dentro da casa. Cleci Calvi Cardoso, de 46 anos, Miliane Calvi Cardoso, de 19 anos, Manuela Calvi Cardoso, de 13 anos, e Melissa Calvi Cardoso, de 10 anos, foram mortas dentro de casa no Bairro Florais da Mata, em Sorriso.
Segundo a Polícia Civil, três das quatro vítimas foram encontradas degoladas e com sinais de abuso sexual. Já a criança teria sido morta por asfixia.
Durante o interrogatório, Gilberto admitiu que invadiu a casa das vítimas pela janela do banheiro para roubar, mas que entrou em luta corporal com a mãe das meninas. Neste momento, a filha mais velha saiu do quarto para socorrer a mãe e também foi atacada.
Na sequência, ele confessou que assassinou as outras duas vítimas, ambas menores de idade.
Ainda durante o interrogatório, o investigado contou que saiu da casa pela mesma janela por onde entrou e voltou para a obra, onde retirou as roupas sujas de sangue e guardou em um contêiner.
O investigado foi preso em flagrante no mesmo dia e teve a prisão mantida. Ele foi levado para a Penitenciária Dr. Osvaldo Florentino Leite Ferreira, em Sinop. Depois, foi transferido para a Penitenciária Central do estado (PCE), em uma cela individual, sem contato com os demais reeducandos, como determinou a autoridade judicial.
Cleci Calvi Cardoso (46 anos): homicídio qualificado pela crueldade; recurso que impossibilitou a defesa da vítima; agiu para garantir a execução de outro crime; e com menosprezo pela condição de ser mulher e estupro.
Miliani Calvi Cardoso (19 anos): homicídio qualificado pela crueldade; recurso que impossibilitou a defesa da vítima; agiu para garantir a execução de outro crime; e com menosprezo pela condição de ser mulher e estupro.
Manuela Calvi Cardoso (13 anos): homicídio com 5 qualificadoras: crueldade; recurso que impossibilita a defesa da vítima; para garantir a execução de outro crime; menosprezo pela condição de ser mulher; e crime contra vítima menor de catorze anos e estupro de vulnerável.
Melissa Calvi Cardoso (10 anos): homicídio qualificado por asfixia; recurso que impossibilitou a defesa da vítima; para garantir a impunidade de outro crime; menosprezo pela condição de ser mulher; e crime contra vítima menor de catorze anos.
Em maio de 2024 ocorreu a primeira audiência do caso. Durante a sessão, foram ouvidas as declarações de três familiares das vítimas e de oito policiais civis e militares que participaram das investigações e diligências.
Em junho de 2024, o advogado Conrado Pavelski Neto protocolou um pedido de indenização de R$ 40 milhões contra o Estado, em nome do pai e da avó das vítimas, responsabilizando o governo pela negligência que permitiu a tragédia.
Em julho de 2024, o juiz Rafael Depra Panichella determinou que Gilberto fosse submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri. Entretanto, a Defensoria Pública recorreu da decisão, e o julgamento segue sem data definida.
O crime expôs falhas no sistema de justiça criminal. Meses antes da chacina, em setembro, Gilberto procurou ajuda em uma delegacia após cometer estupro e tentativa de homicídio em Lucas do Rio Verde, mas os policiais não o identificaram devido a erros na base de dados.
O caso motivou a senadora Margareth Buzetti a apresentar o Projeto de Lei Mulheres Calvi Cardoso (PL 6212/2023), propondo a criação de um Cadastro Nacional de Pedófilos e Predadores Sexuais, além de maior transparência em processos judiciais envolvendo crimes graves.
Um ano após o crime, a população de Sorriso ainda aguarda o desfecho do caso. O processo tramita no Tribunal de Justiça de Mato Grosso, onde o recurso da defesa de Gilberto está em análise. A família das vítimas, assim como os moradores da cidade, espera celeridade no julgamento para que o assassino seja responsabilizado pelos atos que chocaram o país.